Flávio Cruz

Esse estranho mundo...

Textos

Ao pé da letra

 
O Godofredo chegava a ser chato com sua mania de levar tudo ali, em cima, sem margem para nada. Era detalhista a um ponto que irritava. Você não podia deixar nada em aberto, nada liberado para a imaginação. As coisas tinham de ser definidas, enquadradas, estabelecidas.
Nós trabalhávamos juntos e um dia precisei repassar para ele uma ordem de meu chefe. Precisávamos melhorar as vendas, precisávamos ser criativos. Dei algumas sugestões, apelei para sua criatividade.
Foi aí que ele ficou desesperado e começou a fazer um monte de perguntas. Precisava  de detalhes, precisava de mais explicação. Então desisti  e falei:
-Godofredo, você  não pode querer entender tudo ao pé da letra. Existem coisas que só se sugerem, você precisa criar em cima disso. Você precisa inventar, imaginar...
Percebi então que ele estava se desesperando e parece que o ouvi murmurar:
-Ao pé da letra...


Entendi o que se passava em sua mente. Quase podia ver. O Godofredo tinha colocado em sua tela mental todas as palavras que eu tinha dito. Daí pôs um pezinho imaginário em cada letra de cada palavra. Imagino até os pezinhos se mexendo e ele observando. Ele estava realmente levando as minhas palavras ao pé da letra. E eu que pensei que letras não tinham pé, a não ser no mundo metafórico. Coitado do Godofredo.

 
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Flávio Cruz
Enviado por Flávio Cruz em 01/07/2013


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