Um Pouco de Dignidade
O pequeno Diego adorava seu pai. Por isso o que estava acontecendo ultimamente trazia uma grande tristeza para seu coração. O pai andava sombrio, acabrunhado. Havia perdido o emprego. A mãe dava a maior força. Não só ela aguentava as coisas no campo financeiro, pois ela ainda tinha um salário, mas também no campo psicológico. Ficava o tempo todo tentando consolar o chefe da família. Ele se sentia humilhado e preocupado vendo a esposa ter que trabalhar tanto. À noite eles conversavam bastante e Diego podia ouvir de seu quarto. Às vezes eles elevavam um pouco a voz mas era só porque um se preocupava muito com o outro. O garotinho entendia muito pouco do que eles falavam. Ainda assim, prestava muita atenção, queria ajudar. Um dia ouviu o pai falar que precisava de sua dignidade de volta. A esposa respondeu que ele era a pessoa mais digna que ela conhecia. Diego não entendeu quase nada da conversa, mas ficou claro para ele que a tal da dignidade era muito importante e era disso de que o pai precisava. Não teve dúvidas. No dia seguinte, logo que sua mãe saiu para o emprego e seu pai saiu para procurar um, avisou para a empregada que iria brincar lá fora. A dona Eustáquia sabia que ele era um bom menino e não havia problema nenhum em deixá-lo sair um pouco. Assim que saiu da vista da empregada, foi para a rua e começou a tocar as campainhas das casas Quando perguntavam o que ele queria, ele não hesitava nem um pouco: -Meu pai anda triste e ele disse que precisa de um pouco de dignidade. O senhor pode ajudar? Algumas pessoas riam, outras falavam qualquer coisa, outras balançavam a cabeça. Passou quase duas horas tentanto achar a tal de dignidade, e nada. Devia ser algo muito difícil ou raro, pois a maioria das pessoas nem sequer tentava ajudá-lo. Voltou para casa, desolado. Chegou a tempo. A dona Eustáquia ainda não havia percebido que ele não estava no quintal. À noite os pais voltaram. O pai continuava arrasado, o que significava, com certeza, que ele não havia encontrado a tal da dignidade. Diego fez um firme propósito de continuar a sua empreitada no dia seguinte. Assim que a Eustáquia se distraiu, Diego recomeçou sua tarefa. Dessa vez resolveu tentar a rua de trás. Havia umas casas chiques por lá, quem sabe não seria mais fácil encontrar o que procurava.Tinha visitado seis casas e já estava cansado. Nunca pensou que pudesse existir algo tão difícil assim. Não era por menos que seu pai estava tão chateado. A tal da dignidade era realmente um negócio difícil de se achar. Na sétima casa, entretanto, ele teve uma surpresa. Nem precisou tocar a campainha. Aquele senhor de terno, que estava saindo para a rua, parou e ouviu-o com muita atenção. Foi o primeiro. Perguntou tudo. Como sabia que o pai precisava daquilo, o que ele havia escutado, etc. Diego sabia que não era certo ficar contando as coisas que aconteciam em casa, mas aquela era uma situação especial. Era um homem experiente e imediatamente entendeu o que estava acontecendo.No final da conversa, o senhor Armando perguntou para o garoto o que o pai fazia. Ele respondeu que ele mexia com computadores. O respeitável senhor sorriu e disse que iria ver o que podia fazer, e logo a seguir perguntou onde o Diego morava. Afinal de contas, aquele dia não fora tão mau assim, havia alguma esperança. Aparentemente o senhor Armando entendia um pouco de dignidade. Dia seguinte, logo cedo, o pai abriu a porta e ia saindo mais uma vez para procurar emprego. Logo a seguir, Diego ouviu vozes lá fora e espiou pela janela. Viu o senhor Armando falando com seu pai. Logo depois ele entrou no carro do senhor Armando. À noite, a mãe já estava em casa quando o marido chegou todo feliz. Feliz não, exuberante. Deu um longo abraço na esposa e lhe contou as boas novas. Havia conseguido um emprego. Contou toda a história, como aquele homem de uma rua próxima ficou sabendo que ele era especialista em informática, que estava desempregado, etc. O Diego também ganhou um grande abraço. O garoto nunca contou a história para os pais. Achou melhor não falar nada. Eles poderiam ficar preocupados pelo fato de ele sair por aí, procurando pela dignidade. Além disso, a dona Eustáquia poderia levar uma bronca por não prestar atenção no que ele estava fazendo. Também existia a possibilidade de alguém mais precisar de dignidade mais tarde e certamente iam ficar de olho nele. Ia ficar difícil sair pelas ruas... À noite, antes de dormir, ele ouviu de seu quarto seus pais conversarem, animados, na sala. Parecia até que estavam fazendo planos. Pensou como devia ser mesmo importante a dignidade. Que bom, pensou, ainda bem que conseguiu achar uma para o papai... Flávio Cruz
Enviado por Flávio Cruz em 03/12/2012
|