Rosie e seus quatro maridos
Lá vou eu com minha van para mais uma corrida. Desta vez bem no interior, para ser mais específico, bem no meio do mato. Depois de muito dirigir, chego finalmente ao local. Duas ou três casas, ou melhor, trailers, espalhados num grande lote com cerca de madeira. Vou me aproximando da casa e vejo, por baixo dela (era erguida por umas pilastras de madeira a meio metro de altura), um cão vira-lata quase sem pele, um porquinho e umas galinhas. Era quase inimaginável aquela cena a apenas algumas dezenas de milhas de uma cidade espetacular, cheia de sonhos, como Orlando.
Antes que pudesse divagar muito pela minha tese sobre a antítese urbana da Florida Central, Rosie pula lépida para dentro do veículo. Cheguei a esboçar um "good morning" mas não houve tempo. Rosie começou a reclamar do marido. Não trabalhava nem fora, nem em casa, e ainda pedia dinheiro para cigarros. A Rosie era loira, baixa, gordinha, bem simpática, bem arrumada mas maltratada pela vida, pele irregular, e os cabelos, apesar de penteados, tinham algo de estranho. Havia se maquiado sim, e nos lábios exibia um vermelho mais vivo do que o do Kremlin. Mas, voltando ao marido, não conseguia entender como se envolvera com um traste daqueles. Gozado como as pessoas se comportam desta forma com um estranho como eu. Talvez sintam que a van seja uma espécie de divã e o motorista uma espécie de psicólogo. Enfim, ela não poupou “elogios” ao atual marido, porque, como estava me explicando, esse era o quarto. Sem perguntar se eu queria ouvir a história, começou a falar do primeiro. Era muito trabalhador. Fazia horas extras, não bebia, não fumava, ia direto da casa para o trabalho e vice-versa. Até que ela se encheu pois ele não tinha tempo para ela, que ficava sozinha em casa o tempo inteiro, e o mandou embora. Nem uma semana se passou para perceber a idiotice que tinha feito: agora não tinha marido, nem renda, nem nada. Não teve dúvidas. Foi atrás dele e pediu para ele voltar. Qual o quê! Marido assim, dando sopa, não fica à toa nem um dia sequer. Lá já está ele instalado com outra mulher. Rosie insistiu ainda algumas outras vezes mas aquele tinha ido para sempre. Gone forever. O segundo veio com um filho de 5 anos e era sem graça. Trabalhava sim, mas não era fanático. Não precisou nem mandar embora. Depois de um tempo ele sumiu para nunca mais voltar. O detalhe é que deixou o filho com Rosie sem perguntar se ela queria ou não. Ficou pensando que talvez ele não tenha gostado do fato de ela classificá-lo como “redneck”. Ele havia enumerado uma série de características de redneck que ele não tinha. A verdade, disse Rosie, que embora ele tivesse razão em parte, alguns aspectos básicos ele tinha sim. Chegou à conclusão que ele era um “borderline redneck”. Rosie não conseguia ficar muito tempo sem marido, por isso tratou de arrumar o terceiro. Não era muito trabalhador mas sempre arrumava algum dinheiro para casa e além disso gostava do menino que não era nem dele, nem dela. Antes de casar ele havia prometido abandonar aquele hábito feio de mascar fumo. Os dentes dele eram marrons e isso era muito nojento. Ele largou sim o hábito para se casarem. Dois dias de lua de mel se passaram e não é que o danado volta com aquela mania horrível de mascar. Que traição! O casamento não durou muito também. Não sei se o fumo teve alguma influência ou não. E lá estava Rosie com o quarto. Ela explicou de novo que ele não trabalhava nem em casa, nem fora. Nem plantava no jardim, não sabia matar porco nem galinha. Que traste. No entanto, tratava bem o menino.Ah, o menino! Estava esquecendo de explicar. O menino não era dela, nem do primeiro marido, nem do terceiro e nem do quarto. Era do segundo. Não, também não era. O segundo marido trouxe o menino de um casamento em que a mulher o abandonara com um filho que não era dele. Rosie não sabia explicar se a ex-mulher do segundo marido era a mãe do menino. Talvez ela tenha recebido o menino, também, de outro casamento...Mas que diabos, que importância tem isso?
P.S. A história é verdadeira e a Rosie também. Eu só diminui um pouco as coisas em relação à realidade para você não achar que estou exagerando...
Flávio Cruz
Enviado por Flávio Cruz em 23/05/2012
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